Eu
te saúdo oh! Ana Carolina, menina pequenina envolta em cor-de-rosa numa alcofa
de ternura entre o olhar doce da tua mãe e a força do teu avô, entre o frio da
tarde a anunciar hipóteses de chuva e a minha pressa em te conhecer. Tu não
sabes mas minutos depois de te ter conhecido, eu comprei uma embalagem de beijinhos a fiz-me à estrada a caminho
de Lisboa. Tu não sabes mas nessa tarde choveu muito. As terras por fim
encharcadas fizeram deslizar essa água fértil para as valetas. Passei pelas
Gaeiras, pela Ponte Seca, pela Sancheira Grande, pela Palhoça, pelos Carreiros
e pelo Cercal, sempre debaixo de uma chuva que nos anunciava e nos trazia de
facto a fertilidade. E tu dormias descansada nos braços do teu avô dando à tua
mãe um pouco de descanso nas rotinas e nas tarefas diárias perante um
recém-nascido. Tu não sabes ainda mas a fertilidade começa pela água e eu já não
via chover assim desde 2003. Aquilo a que chamamos «vida» começa com um momento
que se define como «o rebentar das águas». Pequena e indefesa, oh! Ana Carolina
tu não sabes como gostei de te conhecer e de fazer esta viagem entre as Caldas
da Rainha onde ficaste e Lisboa onde te escrevo esta saudação breve e
emocionada. Vejo, naquela chuva que caiu poucos minutos depois de te conhecer,
um anúncio de vida e de alegria contra a aridez hostil da seca do ano que
passou. As valetas da estrada velha entre as Caldas e Lisboa ficaram cheias de
água nessa tarde em que te vi pela primeira vez. E os meus olhos cansados
ficaram com uma neblina de júbilo. Graças a ti oh! Ana Carolina e à tua alegria
cor-de-rosa dentro de uma alcofa de ternura. Porque o teu rosto envolto em rosa
foi uma presença efectiva no espelho do meu velho Citroen, cinzento e cansado.
E cheirava a maçãs no pequeno habitáculo entre a pressão da chuva e o negro
asfalto da estrada velha das Caldas até ao Cercal.
[Crónicas
do Tejo 239]
(Óleo de Gary Melchers)
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