Esta
crónica é dedicada a Cecília Milheiro e Manuel Sequeira. A primeira porque diz
sempre «bem haja» e faz do balcão da Farmácia na Estrada de Benfica um altar de
paz onde as angústias de quem leva na mão uma receita se dissipam devagar; o
segundo porque sendo taxista e autor de um Blog («o fogareiro») viaja pelas ruas
de Lisboa como quem corre pelos calhabardais dos Montes da Senhora que são
seis: Aldeia Cimeira, Monte de Cima, Monte do Meio, Monte de Baixo, Monte do
Trigo e Monte do Barbo. A crónica de Baptista-Bastos surge no livro «As
palavras dos outros» (Editorial Futura) e começa com estas palavras: «Escrevo
no balcão da casa das piçarras negras, no último dos meus dias beirões. O vento
da tarde arrasta consigo odores de urze velha e de pinhos novos – e percebo, de
repente, que estou a despedir-me. Dobro os olhos para leste, onde a serra de
Moradal se rasga num desfiladeiro logo baptizado de Ocreza e a ideia de ficar
impõe-se-me de tal força que a ideia de partir vira num sentimento penoso.
Pelas taipas de janela da loja, ao lado, saem os fumos do meu jantar da tarde;
a miúda Martinha está a observar-me, em silêncio, do terreiro coberto de mato;
Chico Canhoto veio com as bestas dos campos de arroteio e ofereceu-me uma
saudação fraterna e sorridente; ontem, no largo junto à fonte, vi bandos de
raparigas tristes, sem rapazes, na mesma hora em que Carminda, viúva de um vivo
que reside temporariamente em Lisboa, depunha flores pobres na campa rasa do
filho Armando, morto de tétano, com 2 anos – e, ao fazer o balanço das minhas
recordações, percebo, de repente, que estou a despedir-me. Despeço-me destas
terras poderosas, verdes como esmeraldas, destas terras cerdosas de cardos, de
fetos, de raízes, de xistos – não fecundadas pelo braço jovem que está
longe.»
[Crónicas
do Tejo 154]