segunda-feira, 28 de outubro de 2024

«Caos e catástrofe» de Luís de Miranda Rocha

Luís de Miranda Rocha (1947-2007) deixou um livro inédito dedicado a J. L.Pires Laranjeira, recuperado do seu computador por Zulmira de Miranda Rocha. Escritor, jornalista («Diário de Lisboa») e professor (CENJOR) foi também ensaísta, crítico e poeta. Estreado em livro no ano de 1968 («O corpo e o muro») publicou 20 títulos até 2003 na área da Poesia e 7 títulos no domínio do ensaio entre 1977 e 2006.Embora natural de Mira, publicou vários livros em Santarém – dois de poesia e um de ensaio.

O ponto de partida deste livro escrito entre 2005 e 2006 é o som do Mundo: «A vida que vivemos desvivemos/ouvindo-o a nossa vida nele ressoa». A ligação entre a vida e o Mundo («A vida com que o mundo se confunde/o mundo com que a vida se conforma») explica-se na página 9: «Se o mundo é esse caos que se mantém/a vida nele que o não ordena agrava/o mundo é que então agrava a vida/no mundo é que então se entrevê/a catástrofe que às vezes acontece/é no caos que se gera e dele resulta/e dele à vezes já nem se distingue».Tal como o título do livro, o poema da página 10 liga o caos à catástrofe: «Nem sempre o caos precede/a catástrofe às vezes/ acontece e somente/depois o caos se forma». O poema da página 39 adverte: «Não há como impedir que uma catástrofe/ocorra não se sabe onde ou quando». Já o poema da página 57 sugere «Que se instaure o estado de catástrofe/por tempo indefinido» porque «A nossa vida anda tão errada/a nossa vida o mundo o nosso mundo». O ponto de chegada é esperança: «Depois que baixe o som desta desordem/então que se insinue um senso que/Então que se sugira outro sentido.»

(Editora: Crescente Branco, Desenho: Manuel Oliveira, Composição: César Antunes)

 [Livros e Autores 26]


domingo, 6 de outubro de 2024

«Asas de papel» de António Ferra

António Ferra estreou-se na área da Poesia em 2006 - «Com  cidade no corpo».  Depois do anterior «Ente» em 2020 («um gajo tem de se preparar para a vida eterna»), António Ferra surge com «Asas de papel» em 2021 procurando que o poema seja o lugar da síntese, do resumo, da brevidade, do desafio ao leitor.

O primeiro poema pode ser lido como diálogo com a fotografia do desenho colocada ao alto da página: «o destino dos pássaros migrantes /nas asas de papel de revistas semanais». No poema seguinte reflecte-se de novo a noção de viagem: «tantos danos na viagem pelo corpo/e as aves insistem na rugosidade das pedras». Depois das aves surgem as laranjas («as laranjas amadurecem fora da época/sobre um tanque gelado na montanha») e as árvores: «as árvores não deixam sombra na sombra que deixamos»

Na paisagem e no povoamento deste livro breve cabe também uma reflexão sobre o acto de comunicar: «às vezes não dizemos nada/achamos que as palavras nos dividem»

Na dupla inscrição (poema/desenho) o autor mantém a sua paralela actividade de artista plástico, ilustrando algumas das suas obras – como é o caso deste «Asas de papel».

(Impressão: Gráfica 99, Desenhos: António Ferra, Paginação: Sérgio Ninguém)

 [Livros e Autores 25]