Paulo
Marques da Silva (n.1966) depois de «Fernando Namora por entre os dedos da
PIDE» (2009), «Condeixa – paisagem, memória e história» (2010), «Deniz Jacinto
entre duas paixões – o Teatro e a Liberdade» e «Pois não te resta ainda o
Mundo?» (2015) sendo dois livros em co-autoria, surge com este «A PIDE e os
seus informadores – O caso de Inácio» (2019) que faz a cartografia tenebrosa
dum tempo (anos 30 a 60 do século passado) e de um lugar (Coimbra e seus
arredores) inventariando as suas instituições e os elementos que não estavam com
o Estado Novo. O ponto de partida é a página 63: «Todos os Organismos Oficiais
estão cheios desta gente, tais como: Correios, Hospitais da Universidade,
Governo Civil, Câmara Municipal, Polícia Judiciária, Polícia de Segurança
Pública, Tribunais, Grémios e Regimentos. As ligações são a toda a hora e
momento, a sua acção estende-se por toda a parte e hoje o Estado Novo é
arrasado, alto e bom som, em todos os pontos da cidade sem o mais pequeno
rebuço. Os jornais da cidade são todos dirigidos por elementos avançados já
referenciados e os correspondentes dos jornais de Lisboa e Porto na mesma.
Todos os Cafés da cidade são pontos de reunião de elementos avançados que,
abertamente, ali fazem o seu trabalho.»
O
delírio de Inácio vai ao ponto de chamar «reviralhista» a Afonso Duarte e
«comunista» a Joaquim Veríssimo Serrão: «… dentro da Universidade e em grupos
desafectos foi bastantes vezes notada a propaganda que o SERRÂO fazia, sendo
notória a sua acção avançada» O uso de certas palavras (seita, perlenga) denota
não só agressividade mas também ignorância: «O alferes Rosa Neto tinha em seu
poder vária papelada e até jornais da Seara Nova». Noutro passo refere o Ateneu
de Coimbra: «São maus e rancorosos. É um agrupamento que, num caso de conflito
interno, vem imediatamente para a rua, constituindo brigadas de choque.» Para
além de propor o encerramento de Clubes e Associações, Inácio critica a pouca
firmeza das autoridades: «Como é sabido não se efectuaram prisões por causa dos
desmandos efectuados e agora os homens do MUD e comunistas andam a apregoar que
se o não fizeram é derivante da fraqueza do Governo que se vê num beco sem
saída e até sem prestígio. O tempo do papão e do Tarrafal já passou, dizem.» O Clube
fechado em Pereira do Campo vai renascer sob o patrocínio da FNAT: «O estudante
Luís Mexia, sobrinho do Dr. Mário de Figueiredo, que eles colocaram à frente, é
um pateta mor, sem personalidade alguma. É comido e levado com facilidade por
tal «malta» que o tem ali apenas como rótulo. É com estas habilidades que o
comunismo vai alastrando e aparece em todos os sectores.»
(Editora:
Palimage, Foto da Capa: Maria João Reis Torgal, Colecção: Raiz do Tempo,
Apresentação: Luís Reis Torgal)
[Um livro por semana 673]