Mário Rui Silvestre é autor
multifacetado: contos («Do rio à margem»), romances («Para a morte não ter
razão»), poemas («Ribaterra»), historiografia («As gloriosas máquinas do pão»)
e ensaio («Em torno de Camões») por exemplo. Neste seu recente livro de 472
páginas, o autor organiza, em 16 capítulos, uma narrativa que cruza vários registos. Um deles é o policial («Onde é que
trazes a bomba!?») a propósito do assalto ao automóvel do narrador que
transportava um manuscrito. O outro é o histórico («nesta húmida manhã de 13 de
Março do ano de Cristo de 1147»). O ponto de partida é uma ideia («Hoje Fátima
seria impossível») e uma certeza: «Fátima é uma narrativa compósita,
construída, a maior parte, depois de 1930». Esta data está ligada à morte do
Patriarca Mendes Belo em 1929, ele que «nunca validou com a sua presença
tamanho logro». O jornal «O Mensageiro» perguntava «Como conciliar a afirmativa
de que a guerra acabava no dia treze de Outubro se ainda hoje continua?» O
pároco de Fátima, por sua vez, «nunca foi à Cova da Iria no dia das aparições»
A este aspecto pessoal juntamos o lado social: «O erro da República foi querer
acabar, numa geração, com a religiosidade popular irracional e fanática». Pode
ler-se na página 221 «O verdadeiro milagre de Fátima está nisto: ter sido o elo
aglutinador das forças reaccionárias, religiosas e civis que acabaram com a
República e prolongaram as trevas.» Portugal não mudou muito: «paranóia e
regabofe de reis, abusos do clero e parasitismo de fidalgos». Uma conclusão
provisória: «Se não existisse morte não havia religiões». Um convite à leitura:
«O melhor dos tesouros perdidos é buscá-los». Também por isso este é, sem
dúvida, um livro a não perder.
[Livros e Autores
15]