Zetho
Cunha Gonçalves (n.1960) explica o ponto de partida deste livro de 92 páginas:
«Este é um livro de versões, transversões e reconversões de poemas, provérbios,
adivinhas, frases soltas e outros materiais potencialmente poéticos, vindos de
outras línguas e civilizações – sobretudo africanas e latino-americanas – aqui
transplantados para língua portuguesa.» Depois de lembrar Octavio Paz («Sabemos
que os astecas recitavam, cantavam e dançavam os seus poemas») o autor, nascido
no Huambo (ao tempo Nova Lisboa), regista as semelhanças entre os astecas e os
povos de toda a África subsariana e os poemas que lidam com «as cosmogonias, os
poemas rituais, os cantos de trabalho, de ninar, de celebração, de entronização
e de óbito». Por isso mesmo pode concluir: «não há Poema digno desse nome que
não advenha de uma tradição que em si mesmo cria e nela se transmuda inaugural,
pela voz criada, impositiva e única, inconfundível, do seu Autor.»
Um
dos poemas que melhor espelha a intertextualidade pode ser o da página 12: «Se queres
saber quem sou / Se queres que te ensine aquilo que sei / Deixa de ser um pouco
daquilo que és / E esquece tudo quanto sabes.»
Entre
a Vida (breve) e a Morte (inevitável) só o Amor pode salvar: «Os tempestuosos
quinze anos / Os vinte turbulentos / Os trinta sedentos / Os destrambelhados
quarenta / Os erráticos cinquenta / Os avançados sessenta / Os serenos setenta
/ Os exaustos oitenta / Os anestesiados noventa / Os humildes cem anos!»
A
vida pode ser uma viagem mas há sempre a adversativa como no poema da página
40: («Embora eu tenha chegado ao fim da viagem / Nunca senti que tivesse
chegado») e a única certeza sobre a Vida está na mulher: «Em cada mulher começa
o mundo /e o que dizeis tão serenamente /no tom dos graves sussurros /que
recordo ter aprendido de minha mãe / os segredos da vossa indagação.»
Perante
o desafio do Mundo, o verdadeiro artista, o que não é torpe, tem uma ética na
sua prática: «O verdadeiro artista tudo retira do seu coração; / trablha com
deleite, faz tudo com calma, com prudência / age como um tolteca, compõe
coisas, trabalha habilmente, cria / transforma as coisas, aticula-as, faz com
que se ajustem.»
Em
conclusão podemos proclamar como o poema da página 81: «Retém o que acabaste de
aprender / tu que aprecias sobremaneira o conhecimento /e sabes que o saber
vale mais que o âmbar / muito mais que o coral e até mesmo mais que o ouro
fino.»
(Editora: Maldoror, Capa e Grafismo:
Luís Henriques, Paginação: Diogo Vaz Pinto, Revisão: Andreia Baleiras)
[Um livro por semana 621]
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