Não conheci o Padre Cruz mas estive perto de o conhecer. Outro dia ao subir
a Rua Garrett em Lisboa parei em frente à escadaria da Basílica dos Mártires e
o vendedor de fotografias ofereceu-me esta foto pois achou graça à facilidade
com que a identifiquei. É um facto que não conheci o Padre Cruz mas estive
perto de o conhecer no Montijo. Foi viver para lá em 1957 e o Padre Cruz tinha
falecido em 1948. Muita gente na Rua Sacadura Cabral se lembrava dele a pedir
um púcaro à Tia Pagá e a beber na fonte metálica onde uma mulher lavava a chave
de casa desde a madrugada. Alcochete é perto do Montijo, é uma terra banhada
pelo mesmo Mar da Palha. Para dar uma ideia de como era o tempo sem Internet
nem telemóveis, o ciclone de 1941 ainda estava muito presente em 1957 nas
conversas das pessoas, os fragateiros mortos nesse dia de ventos diabólicos, as
imagens ingénuas dos «ex-votos» no Santuário da Senhora da Atalaia. Ainda lá
devem estar com a sua pintura dita «naif» em forma de oração e acção de graças.
Afinal não conheci o Padre Cruz (1859-1948) mas andei sempre por perto e agora
ainda mais pois é em Benfica que está o seu jazigo. Sei muitas histórias do
Padre Cruz como aquela do barbeiro da Rua da Alfândega onde ele foi bem
atendido mas, como dava tudo aos pobres, não tinha dinheiro para pagar o corte
de cabelo. «Tenha paciência, Deus lhe pagará!» - terá dito o Padre Cruz ao
homem que, além do mais, era um carbonário. Mas, como por milagre, a barbearia encheu-se
de fregueses e até fizeram bicha para, como dizem os profissionais, servir. Nunca
o homem tinha tido tanta clientela. Mas há muitas histórias como aquela de
terem prendido o Padre Cruz no Limoeiro. Foi um reboliço na cidade de Lisboa e
só o Dr. Afonso Costa resolveu o assunto com um documento a proibir que o Padre
Cruz fosse detido.
[Crónicas do Tejo 71]
Sem comentários:
Enviar um comentário