O título do livro remete para
a citação inicial - «Este tempo não ama os alumbrados» do poeta brasileiro
Murilo Mendes. Zetho Cunha Gonçalves (n.1960) sabe que o poeta não precisa de
dicionários; o seu poema é, já em si, toda a gramática do Mundo.
Aqui embora pareça singular, o
destinatário é múltiplo e vário: «Carrega os teus olhos com toda a força do teu
Ser. Com a tua vontade inconteste, afronta o Sol e os seus astros menores: o
erro, a hipocrisia, o amor, a delicadeza e a paixão serão os mesmos – com
outros rostos. Quando uma porta se fecha, volta-lhe as costas – não é outro o
secreto mistério dos pássaros, a depudorada leveza; imperturbável, feliz e
cantante.» Porque a paixão e o poema são fenómenos da mesma ordem: «Vagarosa e
de perfil, da pedra informe e súbita do mundo: magnificência – os astros em
derredor, fulminados pelo desejo: rio selvática e delicadamente sôfrego, exacto.
Absoluto e fatal, irradiante: paixão e poema – rutila ciência indomável» O
terceiro poema mostra de modo hábil como a paixão e o poema se misturam. No
início («Toda a paixão nasce unívoca») no espaço central («um nome estremece o
mundo pelo corpo que devasta») e na conclusão: «E dasabam relâmpagos sobre os
teus olhos – que são nocturnos e perscrutam.» Num tempo e num espaço onde a
vida é precária e a morte inevitável, o poema pergunta: «Oh, meu amor – por que
morrem os amantes?»
Vejamos o poema que pode ser a
chave deste livro breve mas intenso: «É a voz da pedra na caligrafia do Tempo.
Bate forte, bate fundo – o coração do mundo estremecendo alto, deslumbradamente
vivo. Beijo cravado na idade – flor rodada, constelação. Fende a branca
labareda o abrupto relâmpago pela raiz – a noite como um lençol embriagado e
lúcido, acautelando os nossos corpos de estrela a estrela, jubilosamente
iluminados e fatais.»
(Edição no 60º aniversário do
Poeta, Disponível na Livraria Letra Livre, Calçada do Combro – Lisboa)
[Um livro por semana 695]
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