Portugal
é um país de analfabetos que conhece Bulhão Pato pelas amêijoas, Camões pelo
olho perdido em combate e Bocage pelas anedotas. Não há volta a dar a esta
situação. Foi para mim muito penoso e desagradável um destes dias ter ouvido
alguém que parecia um sacerdote católico de Pedrógão Grande enquanto se
paramentava a falar no que temia da burocracia portuguesa como sinónimo de
atraso nas indemnizações. O vómito era grande, o nojo era enorme, a repulsa era
poderosa. Alguém numa televisão pretendia transformar em notícia um simples
temor (ainda por cima) direcionado a uma entidade (burocracia) não apresentada
nem definida nem apontada,
O
mesmo sacerdote católico nada disse (eu não o ouvi) em 2003 quando ardeu
noventa por cento da mancha florestal do concelho de Vila de Rei, morreram
dezoito pessoas e a vaga de calor fez 1593 (ou 1953) vítimas só confirmadas
pelo INE em Janeiro de 2004. Presumo também que nada disse em 8 de Setembro de
1966 quando na Serra de Sintra morreram na flor da idade vinte e cinco jovens militares
do Regimento de Queluz.
Aos
Domingos de manhã há muitas pessoas a sair de uma igreja dos arredores de
Lisboa e a atravessarem a estrada fora das passadeiras tal é a pressa de comprarem
um jornal que em vez de tinta usa a água suja das sarjetas para ser impresso.
Esta relação entre a sarjeta e o altar preocupa-me mas já não a estranho. Em
Portugal é assim. Os que saem a correr da igreja nem reparam no jornal «A Voz
da Verdade» que fica numa pequena mesa ao lado da pia baptismal. «A Voz da
Verdade» é um jornal que tem poucos leitores. Os seus possíveis leitores que
vão à missa dominical preferem um jornal impresso com a água suja das
sarjetas.
(Vinte
Linhas 1698)
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