O
meu avô de Santa Catarina nasceu em 1906 e morreu em 1979. Seu nome é José
Almeida Penas. Era carpinteiro, pintava, fazia portas e janelas e, às vezes,
fabricava pequenos caixões. A ele recorriam as pessoas em casa de quem tinham
morrido anjinhos. O recado era dado por alguém da família, um primo ou um irmão
mais velho do menino morto. Nasci em 1951 e lembro-me bem de o meu avô fazer
caixões pequeno sem levar dinheiro. Julgo até que em vez de pregos ele usava
lágrimas para unir as tábuas. Como conhecia toda a gente na minha terra e nos
lugares à volta (os casais) ele dizia baixinho a sua lamentação perante a morte
daquela criança: «Ah fado dum ladrão!» Com este lamento ele revoltava-se contra
o destino daquele menino cuja vida fora cortada de modo abrupto pelo tifo, pela
meningite, pelo garrotilho. Pela morte numa palavra. Tenho algumas memórias
felizes de meu avô em Rio Maior quando da feira da Cebola lá para Setembro. Ele
e o senhor Josué iam vender a obra de todo um Verão de trabalho – barris,
celhas, tinas, tonéis. Já pensavam na vindima. Depois compravam o sal na Fonte
da Bica por causa da proximidade da matança do porco. A Feira dos Santos era no
Cartaxo e nem me lembro como íamos para lá mas tenho memória de uma taberna
onde num quadro se lembravam os maus pagadores a giz. Havia um identificado
apenas como «chofer da Ribatejana». Uma vez houve pancadaria entre um grupo de
forcados e um conjunto de ciganos mas quando apareceu a PSP os dois grupos
voltaram-se para os agentes da polícia. Entre sorrisos, meu avô afastou-me do
epicentro daquilo e dizia baixinho: «Que grande sarrafusca!» E era mesmo grande
pois chegou até hoje. Sessenta anos passaram num instante. Pode dizer-se em
conclusão: 1957 foi anteontem.
(Crónicas
do Tejo 90 – fotografia de autor desconhecido)
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