sábado, 16 de janeiro de 2021

«Branza» de José Pascoal

Depois de «Sob Este Título», «Antídotos», «Excertos Incertos» e «Ponto Infinito», este livro de 159 páginas reúne poemas escritos entre 2018 e 2019 por José Pascoal (n.1953) natural de Torres Vedras e desde logo o seu título («Branza») remete para a Geografia da zona tal como se indica na página 5: «caruma, sama, agulha de pinheiro».

O ponto de partida é o poema da página 10: «Penso muito nos assuntos /Em que toda a gente pensa: /Na felicidade intensa / E nos queridos defuntos.» A paisagem e o povoamento da infância pessoal do autor está registada nos poemas entre as páginas 46 e 53: O tempo de Dezembro («Na matança do porco /De madrugada»), o lugar do alpendre (»Aqui estou /Aqui sou /À sombra de sombras»), o território sentimental («Aqui me convenço/Aqui te pertenço»),o lugar da inocência («Erva mansa da colina/ Onde se estende a toalha/Bordada pela mãe»), a debulha dos cereais («Ao luar/A eira é uma clareira/ Um castelo de palha»), o calor do pão («A minha avó materna cozia pão de trigo/ A minha avó paterna cozia pão de centeio»), o cofre da casa («No celeiro a luz é fresca»), o ritual do vinho: «O lagar é um lugar/ De índios pé-descalço/ A dançar o fandango».

Mas a inscrição deste livro não se esgota no registo da infância pois entra em diálogo com o Cinema e com a Literatura. No poema da página 91 se referem dois filmes: «O pecado mora ao lado» e «O rio sem regresso».  Nas páginas 27 e 124 são duas as obras literárias revisitadas: «Os Lusíadas» e «A Ilíada». E autores diversos são referidos em vários poemas: Luís de Camões (70), Almada Negreiros (115) Cesário Verde (148), Drummond de Andrade (57), Federico García Lorca (89), Cervantes (78), Camilo Castelo Branco (31), Shelley (66), Maeterlinck (50) ou Jacques Prévert (101).  Ao lado da Natureza está a Cultura.

As palavras são o intervalo entre o Poeta e o Mundo («As palavras de todas as línguas /São animais domésticos») mesmo que esse Mundo seja os chamados três mundos: «Tudo vai bem nos três antigos reinos /Os animais têm direito a voto/Os vegetais são do verde mais esperançoso / Os minerais cintilam sem acinte». Mais do que ser a voz dum Mundo este livro procura e consegue ser um Mundo, ele mesmo.      

(Editora: Editorial Minerva, Pré-impressão: José Ganho)

[Um livro por semana 659]


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