«Eu
sou a filha da Julita» - dizia a menina que me abriu a porta do escritório da
fabrica «Ivo Cutelarias» fundada em 1954 por João Ivo Peralta, irmão de António
Ivo Peralta («Sovi»), amigo da minha mãe (Olímpia do Carmo Almeida) e do meu
pai (José Francisco). Foi no passado dia 8 de Março e houve uma viagem no
tempo. A partir da frase «Eu sou a filha da Julita» lembrei-me de Santa
Catarina em 1966 quando havia as férias «grandes»: a Julita comprava uma cigana para o almoço do pai (Euménio) dito
Ménio, o Roberto inaugurava com o meu
avô José Almeida Penas a época do «abafado» na azenha do ti Zé Padre no Rio do
Casal da Coita que vinha pelo Vale de Água até se juntar ao Rio da Pedra. O meu
avô era guarda-redes da equipa onde jogavam o meu tio-avô Joaquim Freire, o
Juventino do ti Manel Inácio (o
primeiro jornalista), o ti Carlos Pinheiro (que me dava limões), o Abílio
Milhafre (que tocava clarinete), o Diamantino do Manel Lúcio, o Zé Coimbra que tocava pratos na Filarmónica. Eram
onze e não havia substituições. Nos jogos do Campo do Rio da Pedra, mais tarde,
lembro-me do Joaquim Clímaco recolher o dinheiro para a lavadeira num boné.
Esse mesmo Joaquim (irmão do Manel, meu colega na 4ª classe) um Domingo de
manhã salvou-me a vida: a minha avó mandou-me ir buscar a burra ao Vale de Água
e o cão a ladrar à porta do Afonso (ferrador) assustou o animal que dasatou a
galopar. Perto do portão da Casa Grande o Joaquim conseguiu parar a burra e
assim me safei pois poderia ter ficado ali se batesse com a cabeça nas pedras
da rua. O meu avô foi amigo do Artur Sena Pinheiro, fundador da «Senófila» onde
nasceram os Xutos e Pontapés. A vida
é um mistério. A memória é um sótão distante. A prata da minha casa tem onze
heróis. Estão todos na fotografia; ninguém quer sair.
(Crónicas
do Tejo 125 - Fotografia de autor desconhecido)
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