Henry Miller afirmou em «The Books of my life» que a
autobiografia é a mais pura forma de romance pois a ficção está mais perto da
realidade do que os factos. Por seu lado Dinis Machado sempre se guiou por uma
pergunta («Qual é o lado cómico disto?)» em toda a sua vida. Tudo isto tem a
ver com o livro «1968» de António Manuel Venda (n.1968) pois o ponto de partida
é a sua vida e o ponto de chegada é a arte final de cada uma das 21 crónicas,
prova provada de que neste autor o Jornalismo é uma disciplina da Literatura O
conjunto abre com uma citação de Eça de Queirós mas o conteúdo das 119 páginas
desmente as palavras: «Eu não tenho história, sou como a República do Vale de
Andorra.». A primeira crónica lembra um poema de Sebastião da Gama - «Quando eu
nasci/não houve nada de novo senão eu». Vejamos a crónica sobre a professora de
Português em meados da década de 1980: «A professora que na verdade não passava
de uma psicopata, punha as coisas bastante difíceis para nós. Daí que fosse
preciso andar um pouco como na guerra, sempre de olhos bem abertos para ir
sobrevivendo. Uma palavras mal escrita dava não sei quantas dezenas de
repetições em casa.» Já dos tempos do ISCTE fica uma crónica sobre um professor
especial: «Eduardo Ferro Rodrigues destoava um pouco da maioria que nos ia
aparecendo, às vezes até de pára-quedas. Ia num Opel branco, dispensando fato e
gravata e quase sempre com o jornal A
Bola debaixo do braço». O tenebroso sistema cultural português surge na
página 65 quando chamam «premiado faltoso» a um escritor que impediram de ter
acesso à sua cadeira, receber o prémio e ouvir o discurso de José Saramago
sobre os livros premiados. Fica apenas uma ideia dum livro a não perder.
(Editora: On y va, Foto
do autor: Dora Nogueira, Capa: Alexandra Ramires, Grafismo: João Paulo Fidalgo)
[Livros e Autores 33]
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