sábado, 8 de julho de 2017

Lamentação para um tempo passado na foto a preto e branco


Num destes fins de tarde de Lisboa com um céu cheio de nuvens brancas a anunciar trovoadas e bandos de turistas (não viajantes) em calções curtos que sobem as Escadinhas do Duque a gritar «Are you local people?», num destes fins de tarde recebi uma oferta inesperada. Um livreiro em arrumações na sua livraria descobriu desirmanada uma fotografia a preto e branco que me ofereceu. Pode ser a Brigitte Bardot, pode ser uma das jovens actrizes a que os jornais dos anos 60 chamavam «azougadas» e mostravam os seus pequenos biquínis nas praias da Riviera Francesa. O livreiro meu amigo oferece-me a fotografia e com ela o pretexto para uma crónica. Esmo sem estar presente nela esta fotografia tem a ver com esse tempo. Eu era em 1966 um jovem atónito, confuso e perdido na grande cidade. Tinha começado a trabalhar numa sexta-feira nove de Setembro porque nesse tempo trabalhava-se ao sábado até às 13 horas nos Bancos. Não tenho a certeza se actriz é Brigitte Bardot nem isso é agora o mais importante. Sei que este é um retrato desse tempo de guerra e paz, de amor e ódio, de morte e vida. Mesmo quando as manhãs se abriam em esperança as tardes acabavam em amargura. O tempo era triste, a monotonia tudo abarcava, o velho ditador, o monstro de Santa Comba Dão falava na Rádio e na TV para dizer: «Está tudo bem assim e não podia ser de outra forma!»

(Vinte Linhas 1692)

Sem comentários:

Enviar um comentário