Num
destes fins de tarde de Lisboa com um céu cheio de nuvens brancas a anunciar
trovoadas e bandos de turistas (não viajantes) em calções curtos que sobem as
Escadinhas do Duque a gritar «Are you local people?», num destes fins de tarde
recebi uma oferta inesperada. Um livreiro em arrumações na sua livraria
descobriu desirmanada uma fotografia a preto e branco que me ofereceu. Pode ser
a Brigitte Bardot, pode ser uma das jovens actrizes a que os jornais dos anos
60 chamavam «azougadas» e mostravam os seus pequenos biquínis nas praias da
Riviera Francesa. O livreiro meu amigo oferece-me a fotografia e com ela o
pretexto para uma crónica. Esmo sem estar presente nela esta fotografia tem a
ver com esse tempo. Eu era em 1966 um jovem atónito, confuso e perdido na
grande cidade. Tinha começado a trabalhar numa sexta-feira nove de Setembro
porque nesse tempo trabalhava-se ao sábado até às 13 horas nos Bancos. Não
tenho a certeza se actriz é Brigitte Bardot nem isso é agora o mais importante.
Sei que este é um retrato desse tempo de guerra e paz, de amor e ódio, de morte
e vida. Mesmo quando as manhãs se abriam em esperança as tardes acabavam em
amargura. O tempo era triste, a monotonia tudo abarcava, o velho ditador, o
monstro de Santa Comba Dão falava na Rádio e na TV para dizer: «Está tudo bem
assim e não podia ser de outra forma!»
(Vinte
Linhas 1692)
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