O dia 17 de Outubro de 1999 amanheceu com um céu de chumbo.
O jogo foi em Pina Manique às onze da manhã entre o Casa Pia e o SCP. Era um
Domingo. Chovia e ao mesmo tempo estava frio, muito frio. A assistência era
muito reduzida. Não havia público; apenas os pais e os avós de alguns
jogadores. Havia poucos guarda-chuvas à volta do pelado. Ainda na primeira
parte, mais precisamente aos 30 minutos, o árbitro parou o jogo e chamou o
massagista de uma das equipas, o SCP. O jogador nº 10 foi substituído pelo
jogador nº 15. Na altura ninguém percebeu muito bem pois não é muito normal um
árbitro sugerir a substituição de um jogador mas soube-se no fim do encontro,
debaixo de mais uma forte bátega de água, que o jogador nº 10 tinha a pulsação
a 220. A crónica do jogo publicada no jornal «Sporting» refere uma taquicardia.
O coração de Cristiano Ronaldo tinha disparado e ele poderia ter tido um
problema grave de saúde se o árbitro não tivesse tido a sensibilidade para
interromper o jogo dizendo ao massagista Fontinha que o jogador não estava bem.
No meio da chuva, no meio do frio, no meio do calor da luta entre o 3º
classificado e o 11º da tabela do Campeonato de Iniciados, houve um árbitro que
se apercebeu de que o coração do nº 10 já não cabia dentro do peito. Não sei se
ele é enfermeiro ou se é bombeiro ou se é apenas um anjo do céu disfarçado de
árbitro de futebol. Sei que esse jogador nº 10 lhe deve a vida e a carreira que
entretanto teve a sua progressão sempre de fulgor em fulgor. Sei que cada golo
decisivo que esse jogador nº 10 marca hoje com o nº 7 em Maio de 2017, quase 18
anos depois desse jogo em que teve de sair aos 30 minutos, é ao árbitro atento
que o deve. Mais do que o triunfo por 5-0 no lamaçal, aquele dia ficou marcado
com um triunfo contra as emboscadas da morte.
(Vinte Linhas 1687 - Fotografia de autor desconhecido)
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